CONFLITO APARENTE DE NORMAS
É
o conflito que
se estabelece entre duas ou mais normas aparentemente
aplicáveis ao mesmo fato. Há conflito
porque mais
de uma pretende regular o fato,
mas é aparente,
porque apenas
uma delas acaba sendo aplicada à hipótese.
(CAPEZ, 2012)
A
doutrina majoritária apresenta os seguintes princípios para solucionar o
conflito em questão: especialidade, subsiariedade, consunção e alternatividade.
PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE – (Lex specialis derogat generali)
Segundo
Bitencourt (2007, p. 199), considera-se especial, uma norma penal, em relação a
outra geral, quando reúne todos os elementos desta, acrescidos de mais alguns,
denominados especializantes, acrescentando elemento próprio a descrição típica
prevista em norma geral.
Exemplo
1, Gabu transporta duas caixas de lança perfume
do Paraguai – contrabando ou
tráfico de entorpecente? Tráfico
de entorpecente, pois
é mercadoria específica. (o fato se enquadra naquela que tem o algo a
mais - CAPEZ, 2012.)
Exemplo
2, a mãe mata seu próprio filho logo após o parto, sob influência do estado
puerperal. Homicídio ou infanticídio? Infanticídio, segundo define de forma
especial a lei brasileira. (CAPEZ, 2012)
PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE – (Lex primaria derogat subsidiariae)
A
norma primária
em conflito
prevalece sobre a subsidiária. Norma primária
descreve um fato
mais amplo,
enquanto a subsidiária
um menos
amplo, esta descreve um grau menor de violação
de um mesmo
bem jurídico,
uma fase normal
de execução de crime
mais grave. Assim,
a norma que
descreve o “todo”, isto
é, o fato mais
abrangente, é conhecida por primária e,
por força
deste princípio, absorverá a menos ampla, que é a subsidiária, justamente porque
esta última cabe dentro
dela. (CAPEZ, 2012)
A
norma primária prevalece sobre a subsidiária, que passa a funcionar como um
soldado de reserva (expressão de Nélson Hungria). Tenta-se aplicar a norma
primária, e somente quando isso não se ajustar ao fato concreto, recorre-se
subsidiariamente à norma menos ampla (Fernando Capez, 2012, p. 93).
Exemplo:
o agente efetua disparos de arma de fogo sem, no entanto, atingir a vida.
Aparentemente três normas são aplicáveis: o art. 132 – CPC (periclitação da
vida ou saúde de outrem); o art. 115 da Lei n. 10.826/2003 (disparo de arma de
fogo); e o art. 121 c/c art. 14, II do Estatuto Repressivo (homicídio tentado).
T tipo definidor da tentativa de homicídio descreve um fato mais amplo e mais
grave, dentro do qual cabem os dois primeiros. Assim, se ficar comprovada a
intenção de matar, aplica-se a norma primária, qual seja, a tentativa branca de
homicídio; não demonstrada a voluntas
sceleris (animus necandi), o agente
responderá pelo crime de díspar, o qual é considerado mais grave do que a
periclitação. (Fernando Capez, Arma de fogo, cit., p.58-59)
PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO – (Lex consumens derogat consumptae)
Pelo
princípio da consunção ou absorção, a norma definidora de um crime constitui
meio necessário ou fase normal de preparação ou execução de outro crime. Em
termos bem esquemáticos, há consunção
quando o fato previsto em determinada norma é compreendido em outra, mais
abrangente, aplicando-se esta. Na relação consuntiva, os fatos não se
apresentam em relação de gênero e espécie, mas de minus e plus, de
continente e conteúdo, de todo e parte, de inteiro e fração. (Cezar Roberto
Bitencourt, 2007, p. 201)
“Por
isso, o crime consumado absorve o crime tentado, o crime de perigo absorve o de
dano” (Bitencourt, 2007)
PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO EM
TRÊS SITUAÇÕES
CRIME PROGRESSIVO
CRIME PROGRESSIVO – ocorre quando o agente,
objetivando desde o início
produzir resultado
mais grave,
pratica, por meio
de atos sucessivos,
crescentes violações (grifo nosso) ao bem
jurídico. Há uma única
conduta comandada por
uma só vontade,
mas compreendida por
diversos atos. O último ato, causador
do resultado inicialmente
pretendido, absorve todos os anteriores, que
acarretaram violações em menor grau.
Elementos:
1º - unidade
de elemento subjetivo
- desde o início,
há uma única vontade.
2 º - unidade
de fato – há um
só crime,
comandado por uma única
vontade.
3º - pluralidade
de atos - se houvesse um único ato, não
haveria que se falar
em absorção.
4º - progressividade na lesão ao bem jurídico – os atos
violam de forma cada
vez mais
intensa (grifo
nosso) o bem jurídico,
ficando os anteriores absorvidos pelo mais grave.
CONSEQUÊNCIA – o agente só
responde pelo resultado
mais grave,
ficando absorvidas as lesões anteriores ao bem jurídico. (Fernando Capez, 2102, p.95-96)
PROGRESSÃO CRIMINOSA
PROGRESSÃO CRIMINOSA –
compreende três espécies:
- PROGRESSÃO CRIMINOSA EM SENTIDO
ESTRITO – nesta hipótese, o agente deseja inicialmente produzir um resultado e,
após atingi-lo, decide prosseguir
e reiniciar sua
agressão produzindo lesão
mais grave. Distingue-se do crime
progressivo pois não há unidade
de desígnios (no crime progressivo o agente quer desde logo o crime mais grave).
Elementos da progressão criminosa
em sentido estrito:
1º - pluralidade
de desígnios – o agente inicialmente
deseja praticar
um crime
e, após cometê-lo, resolve praticar
outro de maior
gravidade, o que
demonstra existirem duas ou mais vontades.
2º - pluralidade
de fatos – ao contrário
do crime progressivo,
em que
há um único
fato delituoso composto
de vários atos,
na progressão criminosa
existe mais de um
crime, correspondente
a mais de uma vontade.
3º - Progressividade na lesão ao bem jurídico – o primeiro crime, isto é,
a primeira sequência voluntária de atos
provoca uma lesão menos
grave do que
o último e, por
essa razão, acaba por
ele absorvido.
CONSEQUÊNCIA – embora haja duas condutas
distintas, o agente responde só pelo ato final, mais grave. Os fatos
anteriores ficam absorvidos.
ANTEFATO E PÓS-FATO IMPUNÍVEIS
- FATO ANTERIOR NÃO PUNÍVEL – sempre que um fato anterior menos grave for praticado como
meio necessário
para a realização
de outro mais
grave, ficará por
este absorvido (só
será absorvido se for de menor gravidade) - ex.: porte
ilegal de arma
(crime meio)
e homicídio (crime
fim); Súmula
17 STJ – o crime de falso
é absorvido pelo estelionato
quando nele se exaurir.
- FATO POSTERIOR NÃO PUNÍVEL –
ocorre quando, após
realizada a conduta, o agente pratica novo ataque contra o mesmo bem jurídico, visando apenas
tirar proveito
da prática anterior. O fato
posterior é tomado como
mero exaurimento (ex.: após
o furto, o agente
vende ou destrói a coisa).
(Fernando Capez, 2102, p.97-98)
CRIME COMPLEXO – é o que resulta da fusão
de dois ou mais delitos autônomos que
passam a funcionar como
elementares ou
circunstâncias no tipo
complexo (ex.: latrocínio
– roubo + homicídio). O agente
só responde pelo
fato complexo
(ex.: latrocínio), que
absorve os fatos autônomos
que o integram. (Fernando Capez, 2012,
p. 96)
PRINCÍPIO DA ALTERNATIVIDADE
PRINCÍPIO DA ALTERNATIVIDADE –
ocorre quando a norma descreve várias formas de realização da figura típica, em
que a realização de uma ou de todas configura um único crime. São os chamados tipos mistos alternativos, os
quais descrevem crimes de ação múltipla ou de conteúdo variado (ex.: art. 33, caput da Lei de Tóxicos – descreve 18
formas de prática de tráfico ilícito de entorpecentes, mas tanto a realização
de uma quanto a de várias modalidades configurará sempre um único crime).
Quando há nexo causal entre as condutas, o tipo misto é alternativo,
respondendo o agente por um só crime.
Todavia, quando não houver nexo causal, ou seja, quando cada conduta
tiver um tipo autônomo, haverá tipo cumulativo e, portanto, mais de um crime.
Chama-se alternatividade à consunção que se opera dentro de um mesmo tipo
legal entre condutas integrantes de normas mistas. Portanto, a alternatividade
é a consunção que resolve conflito entre condutas previstas na mesma norma e
não um conflito entre normas. (Fernando Capez, 2012, p. 99-100)
Art. 46 da Lei 9.610/98:
“Não constitui ofensa aos direitos autorais:
(...)
III - a citação em livros, jornais, revistas ou qualquer outro meio de comunicação, de passagens de qualquer obra, para fins de estudo, crítica ou polêmica, na medida justificada para o fim a atingir, indicando-se o nome do autor e a origem da obra”.
Referências bibliográficas:
Capez, Fernando. Curso de
Direito Penal I. 16. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2012. 651p.
Bitencourt, Cezar Roberto.
Tratado de Direito Penal. São Paulo: Editora Saraiva, 2007. 754p.
Theodoro Jr., Humberto. Teoria
Geral do Direito Processual Civil I. 53. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012. 822
p.
Silva, De Plácido e. Dicionário
Jurídico Conciso. 1. ed. Rio de janeiro: Editora Forense, 2008. 749p.
Pinto, Antônio Luiz de Toledo e
outros. Vade Mecum. 11. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2011. 2003p.
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